ADONIS
(UNSI AL-HAJ)
LÍBANO
Poesía Árabe
(1929-)
Adonis representa o grupo de poetas que internacionalizaram as letras árabes. Foi editor das emblemáticas revistas Chi´r e Mawágif, que deram, suporte às vozes da renovação poética nas décadas de 1960 e 1980. Naturalizado libanês e residente entre Beirute e Paris, o poeta tem importantes passagens por universidades árabes e européias, tendo vertido ao idioma materno obras de Racine, Saint-John Perse, Yves Bonnefoy, Ovídio.
Ensaísta, propôs uma leitura do cânone árabe a partir de um conceito peculiar de modernidade, segundo o qual o clássico se define pelo sentido de renovação nele implícito.
E assim harmonizou a poesia do momento com a poesia do passado, dispondo a métrica e a rima tradicionais numa partitura que, mesmo ignorando o silabismo contado, chega a um andamento regidos por um ritmo fluido que, inusitadamente, deixa entrever os conhecidos pés métrico da poesia árabe clássica. Explora ao extremo a tendência antiga do imagismo, buscando inspiração em símiles que encontram corpo no inefável, no ineditismo sensorial e conceptual, fundindo o materialismo da alquimia com a espiritualidade de um misticismo quase agnóstico, que alternas consciências animistas, cientificistas e monoteístas. Mito, história, lenda, heroísmo são narrados a partir da consciência individuada do ser (o homem poeta), e, mesmo debruçada sobre o fato histórico, aquela sua poesia que se aparenta a certo tipo de cantar épico que não se deixa prever pela linearidade ou seqüencialidade de tempos e espaços, permanecendo, antes, o vetor lírico como tutor absoluto da linguagem e do texto. Com Adonis, se a poesia perde o véu ou o verniz étnico, em contraposição descobre um frescor renovável sempre que o poema é levado para outras línguas.
Uma das opções propugnadas pelos renovadores é a negação absoluta do recurso ao versos, entendido como unidade melódica assentada sobre uma base métrica regular ou harmonizadora de ritmos diversos, a exemplo do verso branco e livre. Tal negação encontrou na poesia em prosa de Unsi Al Haj a melhor (mas também editor do renomado diário Al-Najar). Unsi pratica um lirismo avizinhado ao dos surrealistas, no qual a consciência transcendente e atemporal humana borra o horizonte das ações históricas se cotidianas. No seu poema-livro A profetisa com seu cabelo longo a tocar as nascentes, um dos mais consistentes de sua obra, o Gênese é narrado da perspectiva masculina que se deixa solapar pela consciência revolucionária da mulher a refletir, mais e melhor que o homem, a misericórdia irrestrita do Criador... tema já tocado por outro poeta lírico, do popular Nizar Qabbani,
mas ainda sem prospecção filosófica.
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POESIA SEMPRE. Árabe Contemporânea. Número 24. Ano 13. Editor Marco Lucchesi. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 2006. 201 p. No. 10 368
Exemplar da biblioteca de Antonio Miranda
Selecionamos apenas 7 poemas, traduzidos por MICHEL SLEIMAN e SAFA JUBRAN:
Assombro cativo
vou em busca da sombra entre os brotos e a erva ergo uma ilha
ligo a ramagem à beira-mar
e quando se perdem os portos e enegrecem os caminhos
visto-me do assombro cativo
nas asas da borboleta
atrás do reino das espigas e da luz na
morada da doçura.
Árvore do dia e da noite
antes que venha o dia chego
antes que se pergunte por seu sol ilumino
e vêm as árvores céleres atrás de mim e andam à minha
sombra os cálices
da flor
então em meu rosto erguem os delírios
ilhas e penhascos de silêncio cujas portas a palavra desconhece
ilumina-se a noite amiga e esquecem-
se em meu leito os dias
depois ao rolarem as fontes em meu peito e
desabotoarem as vestes e dormirem
acordarei água e espelhos e reluzirei
como eles a lâmina das visões
então eu durmo
Templo do dia
olho copos e cálices tornarem-se
almofada
sonho sobre almofada
no momento do parto
no bosque do mame e do desmame
Carrego os meus sinos na
noite até o templo do dia
a seiva é minha eucaristia
entre o pólen e os frutos
as folhas o meu batismo
Árvore do Oriente
fiz-me
rebati tudo
mudei em meu fogo a cerimônia da água e da vegetação
mudei voz e apelo
passei a ver-te em dois
tu e esta pérola que nada em meus olhos
eu e a água nos fizemos amantes
nasço em meu nome da água
nasce em mim a água
eu
e a água
nos replicamos
O signo
fundi fogo e neve
o fogo não me compreenderá os bosques e a neve
permanecerei obscuro e calmo
a habitar flores e pedras
a esconder-me
a perscrutar
a ver
a modular
como a luz entre a magia e o signo
Árvore do fogo
certas famílias as das folhas de árvore
sentam-se perto da fonte
cortam a terra das lágrimas
lêem para a água o livro do fogo
minha família não esperou minha vinda
foi-se
nem fogo nem rastro
Bosque da magia
seja
vieram os pássaros e amalgamaram-se pedra e pedra
seja
acordarei ruas e noite
e passaremos pela alameda das árvores
os ramos serão malas verdes e o sonho
travesseiro no entretempo das viagens
onde a manhã persiste estranha
e imprime seu rosto em meus segredos
seja
apontou um raio chamou-me uma voz
desde o fim das muralhas.
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http://www.antoniomiranda.com.br/poesiamundialportugues/poesiamundialportugues.html
Página publicada em abril de 2025.
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